

É BRIGA! OS RIVAIS MAIS FAMOSOS DA FILOSOFIA
A filosofia se fundamenta desde seu início na Grécia Antiga por meio de discordâncias. É próprio do pensamento em movimento o embate entre ideias. E, se pessoas diferentes têm ideias diferentes, é claro que os filósofos, que trabalham com ideias, vão discordar entre si.
Veja abaixo as principais rivalidades de pensamento na história da filosofia:

#1
HERÁCLITO
X
PARMÊNIDES
O conflito de pensamento de Heráclito e Parmênides é fundamental na filosofia, pois pode ser considerado o primeiro choque de ideias que ainda hoje tem força.
Heráclito defendia a ideia de um mundo contínuo, mutável (vir-a-ser). Para ele, nada permanece, tudo flui. A única lei da realidade, que é captada pelos sentidos, é a mudança. O princípio é o devir, a passagem eterna de um oposto a outro.
Já Parmênides definia este mundo como estável, único e imóvel (ser). O ser é seu princípio e toda mudança é ilusória, ou seja, captada pelo engano dos sentidos. Assim, só a razão livre da opinião e da sensação pode captar a verdade.

#2
PLATÃO
X
ARISTÓTELES
Aqui é uma briga de gigantes. O tema? A estrutura metafísica do mundo e o processo de conhecimento.
Platão defendia o inatismo. Isso quer dizer que, para ele, nascemos como princípios racionais e ideias inatas. O mundo verdadeiro e original está fora deste, que é só uma cópia e morada da mentira.
Já Aristóteles defendia uma visão mais empirista: as ideias são adquiridas através do conhecimento do mundo real, por meio da experiência e pensamento sobre ela. O mundo metafísico está intrinsecamente ligado ao físico, e a verdade depende de um bom uso da razão neste mundo.

#3
AGOSTINHO DE HIPONA
X
TOMÁS DE AQUINO
Apesar de cristãos e santos católicos, aqui temos uma divergência na estrutura do pensamento. Enquanto Agostinho se baseia em Platão, Tomás busca inspiração em Aristóteles.
A linha de pensamento de Agostinho girava em torno de dualismos: cidade dos homens, cidade de Deus; pecado, graça; felicidade; infelicidade; fé e razão.
Já Tomás de Aquino, na contramão, colocava a razão em primeiro lugar, como um rastro e presente de Deus em nós. Ele tentava até mesmo explicar a fé por meios racionais, por exemplo, demonstrando logicamente a existência de Deus. Ele também organiza a doutrina cristã sob os mesmos termos, inclusive argumentando filosoficamente sobre dogmas.

#4
DESCARTES
X
HUME
Aqui há uma rivalidade sobre a origem do conhecimento.
René Descartes é o pai do Racionalismo, a teoria que argumenta que toda a verdade clara e distinta provém da razão. Ele duvida de tudo, no início metodológico de seu caminho filosófico, mas assegura que é o pensamento que justifica a existência.
David Hume, ao contrário de Descartes, é um autor do Empirismo. Ele argumenta que a justificativa para nosso conhecimento provém da experiência. Na teoria deste filósofo, todas as ideias vêm dos sentidos e a verdade não existe de forma inquestionável. Tudo o que postulamos por verdadeiro advém do nosso hábito.

#5
HOBBES
X
ROUSSEAU
Agora o assunto é política. Os filósofos Thomas Hobbes e Jean Jacques Rousseau apresentam duas versões para a passagem do estado de natureza para o estado civil.
Hobbes entende o homem como naturalmente mau. Para ele, somos egoístas e violentos, e somente a sociedade organizada pela lei pode nos controlar. Ela garantiria nossa segurança e paz, cobrando o preço de limitar nossa liberdade. Por isso, o melhor governo é o absolutismo.
Rousseau diverge desse pensamento, porque vê em nós uma tendência natural para a bondade. Ou seja, antes do pacto social, não conhecíamos a violência e a insegurança. Mas todo o problema começou quando alguém cercou um pedaço de terra e disse “isso é meu”. A lei precisou existir, então, para garantir a igualdade e a justiça, mas com ela veio também a insegurança. Por isso, só a democracia garantiria um estado em que a Vontade Geral fosse respeitada.

#6️
HEGEL
X
SCHOPENHAUER
Agora uma luta quase desigual entre um famoso e um ignorado à sua época.
O primeiro é Hegel. Para ele, o real é racional e a história caminha para uma ascensão e melhora, o regresso. Há em toda sua filosofia um ar de otimismo, que nos faz até justificar males históricos. A “razão”, inclusive, é histórica e, portanto, a verdade como resultante dela só é possível de ser construída no tempo.
Já o menos famoso, Schopenhauer, sustenta que o real é em si mesmo cego e irracional enquanto Vontade, e não há nenhuma progressão histórica. Só o caos. Para ele, as formas racionais da consciência não passariam de aparências ilusórias, e a essência de todas as coisas seria alheia à razão. Só nos resta a dor e o tédio, não há motivos para continuar desejando alegrias nesse mundo.

#7
KIERKEGAARD
X
SARTRE
Angústia e existencialismo! Aqui a divergência está nos (importantes) detalhes.
Kierkegaard é cristão e defende que o homem se encontra angustiado por causa do pecado. A primeira angústia inclusive foi a de Adão por ter que lidar com as consequências de seu livre arbítrio. A saída é o salto de fé, um lançamento ao estádio religioso onde se encontra a realização do indivíduo.
Sartre era ateu e isso fez toda a diferença em sua teoria. A angústia para ele provém de nosso estado de completo abandono na existência. Estamos condenados a sermos livres e isso nos lança no mais alto grau de responsabilidade de contrição de nós mesmos. Não há saída, e isso é que abre a desesperadora e libertadora realidade de que podemos ser o que quisermos determinar sobre nós mesmos.

#8
DELEUZE (E GUATTARI)
X
FREUD
De um lado, psicanálise, de outro, esquizoanálise.
Freud, o pai da psicanálise defende que o desejo é marcado pela falta que necessita ser suprida. É um movimento em direção a uma marca psíquica deixada pela satisfação que acalma a necessidade. Então ele pode ser entendido de duas maneiras: como o que nos movimenta em direção a algo que julgamos nos faltar; e como a volta para a sensação de satisfação que outrora experimentamos.
Em Deleuze e Guattari, a abordagem é esquizoanalítica. Para eles, o desejo é produção e nunca reconhecimento de vazio. É a motriz de uma revolução, sempre libertador. Ele não busca nem o que falta, porque é transbordamento criativo e nem a volta de um estado que se foi, pois instaura as variações, as diferenças. Não há neles então uma necessidade de se estabelecer conexões com estruturas do familismo freudiano.

#9
NIETZSCHE
X
(QUASE) TODO MUNDO
É claro que o maior brigão da filosofia não ficaria fora desta lista.
Nietzsche é o maior encrenqueiro da filosofia porque isso faz parte do modo de seu pensar: ele filosofa com o martelo. Mas não só para destruir tudo e todos, mas para — assim como faz um médico, ao auscultar os pacientes — procurar neles vida. Para isso, Nietzsche assume o método genealógico e critica toda a filosofia que o precede.
Então ele vai ter grandes embates:
Com Sócrates por ter dado protagonismo a uma só espécie de razão na filosofia e tornar a equação razão = virtude = felicidade uma violência contra os instintos. Com Platão, por tornar esse mundo insuportável e idealizar a vida. Com o cristianismo, por adoecer e domesticar os impulsos. Com Descartes, por erigir um falso eu, centro individualizador do ser humano. Com Kant, por ser vítima de sua própria metafísica e não conseguir se desgarrar da moral. Consigo mesmo, por ter cedido a Wagner, a Schopenhauer e ao romantismo…
Enfim, Nietzsche era um homem bélico.
Essas lutas são intermináveis. Mesmo depois de mortos, os filósofos mantém a disputa através de seus intérpretes e pesquisadores. Mas se não fosse isso, como sobreviveria a filosofia?
